sábado, 24 de dezembro de 2011

364 Natais

Desde que soube que Noel não existe, me entala na garganta a cara do Natal. E, mesmo sob o torpor de tanta maquiagem, sua feição é sempre pálida, sempre embrulhada em papel-seda.

Optamos pela vontade escandalosamente secreta de comer a coxa do peru, de escapar dos presentes-de-grego de uma tia avó, de beber até que o Eno nos ajude. Nós somos assim. Podia ser fácil – como quando inventamos essa data para celebrar a fraternidade gelatinosa; aquela que, sem cheiro nem gosto, enche a barriga de muitos – crer na fé das coisas miúdas, dos gestos pequenos, dos sentimentos mais limpos e tenros, dos outros trezentos e sessenta e quatro natais.

A gelatina da fraternidade desce vagarosa pela garganta. E isso é o que importa. Enquanto houver digestão, há fome. E que os Natais, maquiados ou desnudos, continuem a matar todas as fomes do mundo.





Guto Stresser

3 comentários:

  1. escreves muito bem.
    http://largataazul.blogspot.com/

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  2. Ainda estou saboreando seu texto, que dá muito mais fome do que a sacia.
    Helo.

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  3. há momentos, que não saboreamos, todavia digerimos; há momentos que nem mesmo lembramos que são momentos, porque estamos sós demais com o nosso amargo. não é dificil deixar o amargo, nem mesmo é dificil se lembrar que o momento é um momentos, questão é saber que se precisa estar, mesmo que na sensaboria; pois o sabor é também, sentir nossa saliva, ou a escassez dela...
    T.S.

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liberdades saborosas